Uma das minhas crônicas inacabadas, inspirada em uma música da Nara Leão de mesmo título.
Dez anos de sua vida dedicados àquele trabalho e, de repente, sem emprego. Sem emprego e sem ninguém para dizer “Boa noite!” quando chegasse em casa, ninguém para massagear-lhe os pés e oferecer-lhe sopa quente.
Sentado naquele pub há duas horas, ele pensava. Pensava no que faria dali em diante. Deveria procurar emprego. Pensava se havia pagado a conta de luz e se teria comida em casa. De repente, olhou para o café morno que a gorda garçonete acabara de lhe trazer. Observou a espuma e o modo como ela dançava enquanto ele dissolvia o açúcar. Sentiu o cheiro. Deteu-se nas bolhas de ar. Elas borbulhavam devagar, num ploft surdo. Seus pensamentos também borbulhavam.
Ficou ali absorto pelo café durante alguns minutos. Havia esquecido de tudo. Até que uma voz o trouxe de volta para a realidade: “Vai esfriar!”. Instintivamente olhou ao redor e observou uma jovem sentada à mesa da frente. Ela havia pronunciado aquelas poucas palavras e rapidamente voltado seus olhos para o jornal que tinha nas mãos. Ele observou-a atônito. Tinha os cabelos tingidos de vermelho um tanto desbotados. Traços leves, pele clara e divertidas sardas pipocavam-lhe as têmperas da face. Tinha uns olhos escuros e profundos, mas um tanto melancólicos. Estava sozinha.
Ele observou-a por alguns instantes. Ela sempre com os olhos no jornal. Ele voltou a mergulhar no café. Provou-o. Já estava frio. As borbulhas haviam acabado, assim como seus pensamentos haviam parado de efervescer. Lembrou da moça. Voltou a olhar para ela e flagrou-a mirando-o também. Aquele olhar era um “Sim”.
Devagar, levantou-se e a passos leves levitou pelo corredor. Seu olfato estava inebriado pelo café, mas pôde sentir um leve odor de jasmim vindo da moça. Jasmim com ferormônios. Aproximou-se dela e, antes que pudesse dizer qualquer palavra, ela convidou-o para sentar. Permaneceram em silêncio.
A garçonete aproximou-se pesadamente com o assoalho rangendo em seus calcanhares. Perguntou se a moça desejava algo para beber. 5 p.m. Ela:“Tea”. Ele: “Tea for two”. Final Feliz.